Depois do
sucesso na imprensa, especializada ou não, rodas acadêmicas são formadas para
estudar as ideias de Thomas Piketty. O seu mais recente livro, “Le Capital au XXIe
Siecle”, pretende trazer evidências estatísticas de que a desigualdade
econômica cresceu nos últimos anos, particularmente na Europa.
Discute-se
se as suas conclusões se aplicariam ao Brasil, avaliação difícil de ser feita
pela falta de dados. De qualquer forma, parece haver uma percepção generalizada
de que a desigualdade tem crescido também no seio da sociedade brasileira,
apesar da distribuição de renda gerada há vinte anos, ou seja, a partir da
estabilização da economia com a implementação do Plano Real.
Parte da
solução para o aumento da desigualdade foi apresentada em livro anterior de
Thomas Piketty – com outros dois autores – lançado em 2011,“Pour une Revolution
Fiscale”, cujo sugestivo subtítulo é um imposto sobre a renda para o século
XXI. Nesse texto, pode ser lido um verdadeiro manifesto sobre reforma
tributária.
O ponto a
ser destacado na “revolução tributária” de Piketty é a proposta de um imposto
sobre o capital, que, inclusive, poderia ser cobrado de maneira global. Essa
tributação poderia trazer uma certa igualdade entre a remuneração do capital e
a do investimento produtivo.
Tal
proposta seria aplicável ao sistema tributário brasileiro?
Em uma
análise sumária, verifica-se que as cargas tributárias sobre o capital e sobre
a produção são bastante desiguais, sendo privilegiado o primeiro (capital).
Obviamente, não há como se chegar a uma conclusão segura e universal acerca da
relação da tributação do capital e da produção, pois os fatores e as condições
a serem considerados são particulares a cada caso concreto. Apesar dessa
limitação, em linhas gerais, é possível fazer essa comparação.
A
legislação tributária nacional prevê, em diversos dispositivos, margens de
lucro – presumidas ou fictícias – que norteiam a incidência dos tributos sobre
a renda (Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ e Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido – CSLL). Nas principais delas, a tributação do
capital é menor.
Vamos aos
exemplos: no lucro presumido, a presunção de lucratividade é de 8% para a
indústria e o comércio e de 32% para a prestação de serviços, sendo a carga
tributária, calculada sobre a receita (e não sobre o lucro), de 6,75% e 14,53%
respectivamente. No controle fiscal dos preços de transferência, para os casos
de importação de mercadoria, exige-se uma margem de lucro mínima de 20%, sendo
a carga tributária de 9,25% sobre a receita (e não sobre o lucro) e de 34%
sobre o lucro. Por seu turno, sobre o capital, para investimento em renda fixa
de um ano, a carga tributária é de 20% sobre a remuneração, ou seja, o
rendimento, o lucro (essa alíquota pode ser reduzida a 15%, nas aplicações de
dois anos).
A par
disso, a obtenção de 8%, 32% ou 20% de margem de lucro efetiva (e não presumida
ou fixada por lei) nas atividades produtivas pressupõe certo grau de risco, que
é muito menor na aplicação financeira em títulos do Tesouro, por exemplo, que
podem render a taxa de juros básicas, qual seja, a Selic.
Portanto,
a discussão sobre as ideias de Piketty e sua eventual reprodução para o caso
brasileiro é conveniente e útil. Lembrando que os pontos de reforma (ou
“revolução”) tributária no Brasil, embora passem pela discussão sobre a
tributação do capital, vão muito além dela.
Fonte:
Valor Econômico