terça-feira, 26 de agosto de 2014

A reforma tributária de Thomas Piketty



Depois do sucesso na imprensa, especializada ou não, rodas acadêmicas são formadas para estudar as ideias de Thomas Piketty. O seu mais recente livro, “Le Capital au XXIe Siecle”, pretende trazer evidências estatísticas de que a desigualdade econômica cresceu nos últimos anos, particularmente na Europa.

Discute-se se as suas conclusões se aplicariam ao Brasil, avaliação difícil de ser feita pela falta de dados. De qualquer forma, parece haver uma percepção generalizada de que a desigualdade tem crescido também no seio da sociedade brasileira, apesar da distribuição de renda gerada há vinte anos, ou seja, a partir da estabilização da economia com a implementação do Plano Real.

Parte da solução para o aumento da desigualdade foi apresentada em livro anterior de Thomas Piketty – com outros dois autores – lançado em 2011,“Pour une Revolution Fiscale”, cujo sugestivo subtítulo é um imposto sobre a renda para o século XXI. Nesse texto, pode ser lido um verdadeiro manifesto sobre reforma tributária.

O ponto a ser destacado na “revolução tributária” de Piketty é a proposta de um imposto sobre o capital, que, inclusive, poderia ser cobrado de maneira global. Essa tributação poderia trazer uma certa igualdade entre a remuneração do capital e a do investimento produtivo.

Tal proposta seria aplicável ao sistema tributário brasileiro?

Em uma análise sumária, verifica-se que as cargas tributárias sobre o capital e sobre a produção são bastante desiguais, sendo privilegiado o primeiro (capital). Obviamente, não há como se chegar a uma conclusão segura e universal acerca da relação da tributação do capital e da produção, pois os fatores e as condições a serem considerados são particulares a cada caso concreto. Apesar dessa limitação, em linhas gerais, é possível fazer essa comparação.

A legislação tributária nacional prevê, em diversos dispositivos, margens de lucro – presumidas ou fictícias – que norteiam a incidência dos tributos sobre a renda (Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL). Nas principais delas, a tributação do capital é menor.

Vamos aos exemplos: no lucro presumido, a presunção de lucratividade é de 8% para a indústria e o comércio e de 32% para a prestação de serviços, sendo a carga tributária, calculada sobre a receita (e não sobre o lucro), de 6,75% e 14,53% respectivamente. No controle fiscal dos preços de transferência, para os casos de importação de mercadoria, exige-se uma margem de lucro mínima de 20%, sendo a carga tributária de 9,25% sobre a receita (e não sobre o lucro) e de 34% sobre o lucro. Por seu turno, sobre o capital, para investimento em renda fixa de um ano, a carga tributária é de 20% sobre a remuneração, ou seja, o rendimento, o lucro (essa alíquota pode ser reduzida a 15%, nas aplicações de dois anos).

A par disso, a obtenção de 8%, 32% ou 20% de margem de lucro efetiva (e não presumida ou fixada por lei) nas atividades produtivas pressupõe certo grau de risco, que é muito menor na aplicação financeira em títulos do Tesouro, por exemplo, que podem render a taxa de juros básicas, qual seja, a Selic.

Portanto, a discussão sobre as ideias de Piketty e sua eventual reprodução para o caso brasileiro é conveniente e útil. Lembrando que os pontos de reforma (ou “revolução”) tributária no Brasil, embora passem pela discussão sobre a tributação do capital, vão muito além dela.

Fonte: Valor Econômico


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